Jorge Neto Valente, Presidente da Associação dos Advogados de Macau (AAM) considera que a proporção de advogados de língua materna portuguesa em Macau está a diminuir drasticamente nos 30 anos, passando de 70% para menos de 30 atualmente.
“Em 1999, ano em que Macau passou para administração chinesa, havia 87 advogados de pleno direito e 13 estagiários, e a esmagadora maioria, seguramente 70%, eram de língua materna portuguesa”, disse Jorge Neto Valente nas celebrações do 30º aniversário da AAM que hoje se assinala.
De acordo com os dados oficiais, o número de advogados inscritos na Associação dos Advogados de Macau quintuplicou, mas a situação inverteu-se. “Neste momento, eu diria que 70% [dos inscritos] são de língua materna chinesa”, num universo de “436 advogados e 127 estagiários”, apontou o presidente da associação.
Nos últimos anos, “o número de advogados de Portugal que vão para Macau para exercer a profissão tem vindo a diminuir […] Há muito poucos, porque, além da questão da pandemia, os advogados de Portugal não podem chegar aqui, bater à porta e dizer estou cá”.
Uma das principais dificuldades apontadas por Jorge Neto Valente são as autorizações necessárias para residir e trabalhar em Macau, “o que não é fácil”, e “fazer um curso de adaptação ao Direito de Macau”. “Ou então têm de começar pelo estágio, e a maior parte dos advogados não quer ter de fazer estágio outra vez”, explicou.
AAM comemora 30 anos
A Associação dos Advogados de Macau celebra a 21 de maio, 30 anos desde a sua criação, com uma cerimónia oficial que conta com a presença de entidades oficiais.
As comemorações, que se prolongam até domingo, incluem uma exposição de fotografia dos últimos 30 anos, um encontro desportivo entre advogados e magistrados do Ministério Público e uma conferência sobre o Cibermundo e o Direito e a Digitalização da Justiça.
Neto Valente, que foi presidente do organismo em 1996, ainda antes da cessão de Macau à China, voltou a assumir o cargo alguns anos após a transição.
Considera que a língua portuguesa, um dos idiomas oficiais no território, está em recuo também nos tribunais. “Os tribunais têm caminhado no sentido de privilegiar o uso da língua chinesa, embora os magistrados de Macau tenham de ser bilingues […] Chinês todos sabem, e depois, português, uns sabem mais, outros menos, mas há magistrados que são muito bons, são bilingues perfeitos”, acrescentou.
Segundo o dirigente, “nos casos cíveis, há mais produção em língua portuguesa, nos criminais, há mais produção em língua chinesa, por uma razão de facto (…): os suspeitos são, na esmagadora maioria, chineses”.
“Quando chega aos magistrados, muitos deles preferem escrever em chinês, porque o processo está todo em chinês”, explicou o advogado, frisando que o português continua a ter estatuto de língua oficial, consagrado na Lei Básica do território. “Está lá escrito”, sublinhou.
O facto de algumas decisões serem escritas em chinês “cria algumas dificuldades, porque há muitos advogados, mesmo de língua chinesa e locais, sobretudo os que estudaram em Portugal, que ainda pensam o Direito em português”, concluiu.